Clientes
Educação em Direitos Humanos
Dec 03, 2008
Realização: Escola Estadual Julieta Caldas Ferraz (Taboão da Serra - SP)
Justificativa
Se queremos progredir, não devemos repetir a história, mas fazer uma história nova.
Gandhi
O ambiente escolar reflete e reproduz elementos da convivência social que historicamente foram construídos, sendo assim, nos deparamos, na escola, com situações de intolerância, discriminação, preconceito. A escola vive a diversidade: a maioria dos alunos é afro descendente e um pequeno percentual é de descendentes indígenas. Somos diferentes sim, pertencemos a diferentes grupos étnico-raciais, temos cultura e concepções políticas próprias e todos esses aspectos, em conjunto, são valiosos e importantes tesouros que, em conjunto constroem a história de um povo.
E como educadores, não queremos e não devemos suportar que atitudes discriminatórias e preconceituosas tomem corpo, afinal, é nossa incumbência lutar, entre outras coisas, pelo direito á diferença.
A unidade Escolar, segundo seu projeto político pedagógico, tem como objetivos gerais, “promover a humanização do individuo por meio de ações conjuntas que visem a formação plena do educando abordando temas como ética, cidadania, solidariedade, saúde, cuidado com o meio ambiente de forma que propicie a discussão, reflexão e posicionamento dos alunos diante da vida, do mundo e de suas ações, na busca de qualidade de vida para todos onde o respeito pelo homem e pela natureza estejam presentes”.
Com esse olhar, a Unidade Escolar sempre focou em seus diversos trabalhos temas atinentes a questão da diversidade, seja lá o que diverso for: etnia, gênero, condição física, religião, condição sexual. Procurando evitar que as diferenças e toda a carga preconceituosa que determinados grupos carregam não fossem meramente “toleradas” ou que passassem despercebidas. Muitas vezes, até por desconhecimento, a comunidade escolar age como se o diferente parecesse não existir, fazendo com que muitas dores sejam ignoradas e emudecidas.
Fundamentação teórica
O curso “São Paulo: Educando pela diferença para a igualdade” promovido pela Secretaria de Estado da Educação – São Paulo/2006 abriu espaço para o debate e para a reflexão das questões étnico raciais e toda gama de dificuldade, medo e silencio que envolvem o tema, fazendo, algumas vezes, com que o educador tenha receio ou insegurança de abordá-lo. O curso sensibilizou os educadores, demonstrou por meio de estudos textuais, vídeos, relatos e experiências que a população negra sofre em silencio, que não nos damos conta de como o preconceito está presente nas ações, nas atitudes e que a pior forma de educação é não fazer nada. Segundo o próprio material estudado”...não podemos continuar nos escondendo atrás de um currículo escolar que silencia, impõem estereótipos e lida de maneira desigual, preconceituosa e discriminatória com as diferenças presentes na escola.” Como diz Ferreira Apud do Projeto São Paulo: Educando pela diferença para a igualdade(pág.10, módulo II).
“A morada do educador é ontologicamente ética e política. Fugir a essa dimensão é se trair enquanto pessoa. A articulação desses dói termos, no ato de educar para a vida, convoca-nos a refletir sobre o prazer e a dor de conduzir o outro a caminhos possíveis do exercício de sua liberdade. Nessa direção, aprender a se tornar sujeito exige persistência, pois o se formar para a vida é a longo tempo(...)”
Outro passo importante, na busca pelo conhecimento, foi saber que o Museu Afro Brasil promovia o “ENCONTRO DE EDUCAÇÃO PELA CULTURA: TRADIÇÃO E IDENTIDADE ÉTNICO RACIAL”, encontro que acontecia mensalmente. Nesse espaço houve troca de experiências, de saberes e fazeres que abriram possibilidades de ações no próprio Museu Afro Brasil e na Unidade Escolar.
Objetivos educacionais
Os objetivos educacionais devem envolver toda a comunidade escolar: alunos, professores, funcionários, coordenação e direção, tendo em vista que a cultura da intolerância pode estar presente indistintamente em qualquer membro da comunidade escolar.
Reconhecer-se enquanto ser humano, independentemente da etnia, do gênero, da condição sexual, física, religiosa é um desejo a ser construído no universo escolar e na vida. Tarefa nada fácil quando tratamos de segmentos historicamente excluídos. Este é um dos primeiros desafios. Resta ainda fazer com que todos reflitam sobre suas ações e das de seus colegas quando estas forem de cunho discriminatório, preconceituoso e revelarem atitudes não condizentes com um espaço pretendido de convivência harmoniosa, humana, respeitosa. A partir de tais reconhecimentos e reflexões espera-se atitudes,concepções cristalizadas que possam fortalecer a cultura da intolerância sejam mudadas e ainda que membros da comunidade escolar possam ser agentes de mudança ao perceberem ações preconceituosas em seus colegas.
Desenvolvimento das ações
Histórico
Alguns caminhos foram trilhados até a execução do projeto ‘CONVIVENDO COM A DIVERSIDADE: Mostra cultural/2004, cujo tema trabalhado pelas professoras de Língua Portuguesa e História fora a miscigenação; II Conferência Infanto-Juvenil pelo meio ambiente, em 2005, na qual houve a tarefa de se criar um fórum na comunidade escolar para nele serem discutidas e combatidas situações de preconceito ou discriminações; atividades desenvolvidas pelos alunos no Museu Afro Brasil, em 2006. A sequência de tais trabalhos alicerçou a convicção de que algo deveria ser feito de forma mais incisiva.
A seguir um resumo dos trabalhos realizados.
1º - Mostra Cultural de 2004
Tema geral:
- Diversidade Cultural e Social
Subtemas abordados:
- Árvore Genealógica (estudo das nossas origens familiares)
- Estatuto do Idoso;
- Estatuto da criança e do adolescente;
- Artesanato Brasileiro;
- Formação do Povo Brasileiro: Portugueses, Indígenas, Negros;
- A Miscigenação do Povo Brasileiro*.
* A Miscigenação do Povo Brasileiro
Considerações sobre o tema miscigenação estudado pela 7ª série A, sob coordenação das professoras. O assunto é um mote, fio condutor dos trabalhos que se seguiram, pois se reconhecer enquanto brasileiro é se reconhecer enquanto branco índio e negro. Esse trabalho foi pontualmente o inicio do projeto CONVIVENDO COM A DIVERSIDADE, como se verá a seguir. Neste momento uma breve explicação de como ele aconteceu:
Conteúdos
I) Conceituais/Factuais: A miscigenação do povo brasileiro
II) Atividades de Aprendizagem:
a. Assistir, analisar e debater o documentário de Darcy Ribeiro produzido pela TV cultura, cujo conteúdo era o “Povo Brasileiro” do livro homônimo do autor;
b. Produzir um vídeo com depoimentos de alunos, professores, funcionários e da diretora;
c. Elaborar réplica do quadro de Tarsila do Amaral (Operários), com fotos de alunos e funcionários;
d. Produzir um blog com fotos e depoimentos de alunos sobre as diferenças étnicas;
e. Construir com papel craft o ‘muro das lamentações’ no qual visitantes escreveriam suas impressões sobre o tema;
f. Colocar um fruto na arvore da esperança na qual o visitante escreveria uma mensagem positiva sobre o tema da sala.
III) Atividades de Ensino: Os grupos deveriam fazer uma exposição dos assuntos estudados nas fitas. As professoras suscitariam inferências, análises, debates de idéias sobre o assunto.
IV) Conteúdos Atitudinais: Aquisição do conhecimento e mudança de atitude a partir de tal aquisição. Que o aluno fosse capaz de reconhecer, por mais camufladas que fossem, atitudes preconceituosas e que estivesse disposto a evitá-las e combate-las.
2º - II Conferência Infanto Juvenil pelo Meio Ambiente
Proposta de trabalho organizada pelo MEC que em 2005 teve temas ligados a questões mundiais presentes em acordos, tratados, convenções internacionais assinados pelo Brasil. Veja quais foram os quatro temas:
I. MUDANÇAS CLIMÁTICAS – Protocolo de Quioto;
II. BIODIVERSIDADE – Convenção sobre Diversidade Biológica;
III. SEGURANÇA ALIMENTAR E NUTRICIONAL – Declaração de Roma sobre a segurança Alimentar e Mundial;
IV. DIVERSIDADE ÉTNICO-RACIAL – Declaração de Durban contra o Racismo, discriminação racial, Xenofobia e Intolerância Correlata.
Regras da Conferência
a) Organização das idéias – Eleição de um relator ou uma relatora para anotar as opiniões e sugestões que surgirem durante o debate;
b) Apresentação dos temas.
Cada grupo deve apresentar a pesquisa sobre o Acordo Internacional que estudou e as respostas para as seguintes questões:
a) O que o Acordo internacional pesquisado tem a ver com a nossa comunidade?
b) Qual a responsabilidade pensada?
c) Escolha da responsabilidade – Hora de defender e votar a responsabilidade que cada grupo apresentou;
d) Elaboração da ação – como transformar a responsabilidade assumida em ação.
A responsabilidade vencedora fora a escolhida pela oitavas séries e fora a criação de um Fórum composto por professores, funcionários e alunos cujo objetivo seria a discussão e combate às situações de preconceito na escola. O procedimento seria o seguinte:
Cada situação presenciada ou denunciada de preconceito/discriminação na escola seria levada ao fórum. Tanto a vítima como agressor seriam convidados a participar do grupo de discussão. O fato deveria ser discutido, argumentado pelas partes e convidados objetivando a composição do litígio.
A Conferência e a criação do Fórum acabaram por ser mais um passo dado para o projeto CONVIVENDO COM A DIVERSIDADE. No entanto, mais um trabalho foi realizado com o mesmo objetivo.
3º - MOSTRA CULTURAL DO MUSEU AFRO BRASIL
Evento: Quem entra na roda dança
Em 2006, mais um passo fora dado rumo ao projeto CONVIVENDO COM A DIVERSIDADE. Professores das disciplinas de História, Artes e língua portuguesa foram convocados para o curso “São Paulo: Educando pela diferença para a igualdade”, que além de acrescentar conhecimentos na formação dos profissionais, propiciou contato com o Museu Afro Brasil e posterior participação nas atividades de seu Núcleo de Educação. O Museu realizava mensalmente um encontro de educadores chamado: ENCONTRO DE EDUCAÇÃO PELA CULTURA: TRADIÇÃO E IDENTIDADE ÉTNICO-RACIAL; por meio desses encontros surgiu a oportunidade de a escola participar da 1ª Mostra Cultural do Museu Afro Brasil com as seguintes atividades:
1. Oficina: Jornal do Encontro – Jovens de uma das entidades e da Escola foram convidados para realizarem a cobertura jornalística do evento, sob a orientação da jornalista Liliane Braga;
2. Apresentações Culturais:
- Rap “O cotidiano de um povo guerreiro” (letra e música dos alunos Diego Vinicius Clemente Rocha e Walter Neto)
O cotidiano de um povo guerreiro
Navio negreiro de um povo guerreiro
Que hoje se tornou nosso povo brasileiro
Um sentimento com as índias e os portugueses surgiu
Foi assim que começamos a miscigenar o Brasil
Fomos nós negros que fundimos o metal
Trabalhando dia e noite, noite e dia, pau a pau
Após trabalharmos íamos pra senzala
Depois de ficarmos tomando tapa na cara
Ato de coragem teve o Zumbi dos Palmares
Que ajudou a nossa liberdade
Hora de prestar um pouco de atenção
E ver nas costas de quem foi construída a nação
Nzinga, Vó Mazinga nossa rainha
Nome africano nos trazendo muita ginga
Rima feita com a música dos negros
O som do atabaque bate forte no meu peito
Sou jovem negro do ensino fundamental
Lutando pra acabar com o preconceito racial
Não sou nem pior muito menos diferente
Faço parte do Brasil de afro descendentes
Gente da mesma gente, branco, negro ou nordestino
Filhos de Maria e pai Severino
Simplesmente, menino, esse rap é meu hino
É a voz da África orando por seus filhos
Os trilhos que são traçados pela vida
Acabaram deixando os negros cheios de feridas
A gente precisa dar mais valor a nossa cor
Lutar com a força de Xangô guiado por Oxalá.
3. Distribuição de folhetos com opiniões de alunos da escola sobre preconceito.
PROJETO CONVIVENDO COM A DIVERSIDADE
JUSTIFICATIVA:
Após a II Conferência Nacional Infanto Juvenil pelo Meio Ambiente, e com a responsabilidade de se criar um Fórum na escola para discussão e combate de situações de discriminação e preconceito, surgiu a criação de um grupo para a implementação do projeto. Afinal, com todas as atividades já elencadas, salientando-se o trabalho desenvolvido no Museu Afro Brasil, os alunos já estavam devidamente sensibilizados.
CRIAÇÃO DO FÓRUM:
Em agosto de 2006, iniciamos a formação do Fórum apresentando a todos os alunos do período da tarde a proposta vencedora na Conferência e uma argumentação da necessidade deste Fórum.
Com as idéias amadurecidas, em 2007, os alunos do EF II sugeriram nomes para o Fórum, em votação o nome escolhido foi GECADIS – Grupo Estudantil Contra a Discriminação.
ATUAÇÕES
A primeira tarefa do Fórum fora organizar, em 2006, a ida de um grupo de alunos á Mostra Cultural do Museu Afro Brasil. Alunos do próprio Fórum ficaram encarregados da cobertura jornalística do evento (as atividades e fotos do evento se encontram em anexo).
Atualmente o grupo reúne-se todas às quartas feiras para estudo de temas afins, até o momento o tema mais presente é o bullying.
Há uma intervenção do grupo quando ocorrem denúncias de caráter discriminatório. O fórum age da seguinte maneira: ofensor e ofendido são convidados para debates e reflexões sobre suas atitudes. Na sessão estão presentes todos os segmentos da comunidade escolar, que opinam, aconselham, discutem, relatam sentimentos e experiências.
Também é projeto do grupo a organização de atividades culturais e de estudo de temas atinentes à diversidade sócio-cultural, tais como: idas a museus, bibliotecas, teatro, cinema,etc..
AVALIAÇÃO
Percebe-se que o Fórum legitima-se a cada intervenção que faz, pois temos observado que não há reincidências de casos já apreciados e, além disso, alguns ofensores apressam-se em pedir desculpas ao colega ofendido antes de submeterem-se à apreciação do Fórum.
Outro fato de igual importância é a procura por parte de alunos que se sentem ofendidos aos membros do Fórum, porque sabem que nesse espaço encontram apoio e respeito. Avalia-se também, que com tais atitudes há diminuição de revides, consequentemente da violência na escola, pois as soluções têm sido buscadas na instancia do Fórum.
Portanto a avaliação será contínua, os resultados serão sentidos pela diminuição das ocorrências.